terça-feira, 27 de abril de 2010

Ensaio - Niilismo Fundamental


Texto: Péricles Bueno
Ilustração: Rafael Senra
  
No presente ensaio, ao refletir sobre o fundamentalismo que os telejornais tanto associam ao mundo árabe e seus grupos terroristas, Péricles Bueno reflete sobre as diferenças e semelhanças que um certo grau de niilismo de alguns cidadãos brasileiros não teriam algo a ver com tal comportamento irredutível.




Aqui desse lado do mundo, ou melhor dizendo, aqui desse lugar sujo, corrupto e gambiarrado, ou pior dizendo, aqui do Brasil, vira e mexe observamos na maldita telinha “midiática” (termo detestável) as atrocidades dos “homens-bomba” no oriente médio, que são ninguém menos que o equivalente aos nossos cidadãos de classe média ditos esclarecidos e bem educados. Com a diferença de que o esclarecimento vem da luz de Alá deturpada pelo interesse belicista dos grupos terroristas, e a boa educação é tão somente e essencialmente fundamentalista (suicida).

Eu pelo menos fico estarrecido ao observar aqueles jovens árabes e sua ideologia “explosiva” (sem ironias aqui: aquilo é mesmo terrível), mas me pergunto: cá nesse canto deplorável e por vezes simpático que é nosso miscelâneo país, não teríamos também nossos fundamentalismos? Ou essa característica por vezes encontrada no ser humano só se torna perceptível através da quantidade de napalm amarrada na barriga?

Me dou a liberdade a mim mesmo (inclusive de escrever errado) de criar uma teorização pretensiosa, patética e pseudo-acadêmica, mas que faz algum sentido: não seríamos nós, ocidentais, tupiniquins, malandros de boteco, igualmente um bando de fundamentalistas não-islâmicos? Daí você me diria que não, pois os fundamentalistas tem uma ideologia, e nós não, certo? Errado, você está? Evidentemente que não, penso eu, mas me vejo no dever de refutar: não seria o niilismo uma ideologia?

Se ideologias pressupõem bandeiras em punho, hasteadas tão somente para alardear e escancarar suas escolhas, - que deveriam ser de foro íntimo, mas bom senso ainda não nasce em árvore – não seria a ausência de escolhas uma escolha? (bonito isso, mas não é original, tem numa letra de música) Portanto, se escolheu o nada, ponto. É uma escolha. E na atual “conjunção” adversativa (ou seria conclusiva?), em que o leque de escolhas é algo tão vasto quanto a estupidez de George W. Bush, penso: não seríamos fundamentalistas do niilismo?

Assim como os homens-bomba, nossa sociedade tupiniquim-terceiromundista-neoliberal-hightech-plus está caminhando para a própria ruína. A diferença está em nossa conta de pólvora, mais baixa que a do Taliban. Mas não faz diferença: poluímos, destruímos, desmatamos, assassinamos, sugamos, vampirizamos, dentre outros verbos negativos, e tudo parece bem, pois o fim é inevitável, não há salvadores nem gurus, não acreditamos em nada além da fatalidade dos impostos. Na cartilha do niilismo, tudo acaba e só sobra as baratas para contar a história (elas sobreviveriam a uma hecatombe nuclear, sabia?)... portanto o tempo é de sugar os recursos fundamentalisticamente (momento Guimarães Rosa do texto), até a última ponta, (momento Planet Hemp do texto) ou até o último fio de cabelo no seu paletó (momento qualquer-uma-dessas-duplas do texto).

Elas por elas, continuo estarrecido com tanto fundamentalismo. Seria fundamental manter a calma - se isso também não fosse algum fundamentalismo - o que nos faz pensar nas vantagens de se perder a cabeça, caso elas possam ir além de uma noitada com uma desconhecida às 3 horas da manhã em um beco imundo na neblina, com areia, e tudo isso porquê você cismou com seus botões de perder a tal da fé. Prefiro meu cigarrinho de palha com gosto de solitude bucólica e velhas crenças repaginadas (adoro finais vagos, me desobrigam de pensar em algo genial aos moldes dos textos da revista Veja).

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Contato de Péricles Bueno: periclesbueno@gmail.com

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